Há dois anos, a organização Mais Diversidade revelou que 54% da população brasileira LGBTQIAP+ não se sentia segura para falar sobre sua orientação sexual no trabalho. Essa realidade está vinculada a diversos fatores, como preconceito e violência. No caminho inverso, empresas globais têm colhido bons resultados relativos à inclusão. Devido a importância do tema, os advogados Fabiana Zani e Rodrigo Salerno, do SAZ Advogados, destacam as políticas institucionais que as empresas devem adotar para terem mais diversidade.
O Brasil é o país onde mais pessoas LGBTQIAP+ são assassinadas no mundo, com uma morte a cada 34 horas. Informações coletadas e analisadas pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) revelam que 256 pessoas foram vítimas de morte violenta no país em 2022, sendo 242 homicídios (94,5%) e 14 suicídios (5,4%). Essa realidade traz reflexos para o ambiente do trabalho. Dados da Center For Talent Innovation indicam que 33% das empresas no Brasil afirmaram que não contratariam pessoas LGBts para cargos de chefia e liderança.
O contexto é ainda pior para pessoas Trans. Conforme levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), apenas 4% dessas pessoas possuem emprego formal, 6% possuem emprego informal e cerca de 90% trabalham com prostituição.
Esses números são ainda mais estarrecedores considerando o número de pessoas que integram a comunidade LGBTQIAP+. Uma pesquisa de 2019 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) estima que 2,9 milhões de pessoas de 18 anos ou mais se declaram lésbicas, gays ou bissexuais, cerca de 1,8% da população brasileira. Porém, pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e Universidade de São Paulo (USP) chegaram ao cálculo de que 12% dos brasileiros estão no grupo ALGBT (Assexuais, Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros), ou seja, cerca de 19 milhões de pessoas. O estudo de Giancarlo Spizzirri, Raí Álvares Eufrásio, Carmita Helena Najjar Abdo e Maria Cristina Pereira Lima foi publicado na Nature Scientific Reports.
“Essa é uma situação que afeta muitas pessoas, comprometendo a renda e a saúde de todo o círculo familiar. Por isso, é tão importante que as instituições públicas e privadas assumam a responsabilidade de mudar este cenário, garantindo um ambiente mais seguro e respeitoso para todos. Vale destacar que práticas inclusivas dentro das empresas não são apenas importantes para uma sociedade mais justa e fraterna, são capazes também de reter bons quadros, melhorar a produtividade e movimentar a economia”, afirma a advogada Fabiana Zani.
Já são quase 33 anos que a Organização Mundial da Saúde (OMS) removeu a homossexualidade da lista de distúrbios mentais, reconhecendo os comportamentos como simples expressão humana. Em 2006, o documento Princípios de Yogyakarta visava a aplicação dos direitos humanos à comunidade LGBTQIAP+. Uma tentativa de criação de normas internacionais. Segundo Fabiana, “no Brasil aconteceram alguns avanços específicos, como o direito à união afetiva e o uso do nome social em instituições públicas federais, mas no que diz respeito ao universo do trabalho, a desigualdade e o desrespeito às pessoas LGBTQIAP+ ainda tem um caminho longo a percorrer”
Do modo como estão as leis brasileiras, os direitos da comunidade LGBT estão muito mais amparados por legislações que visam a igualdade e o respeito entre todas as pessoas. Por sua vez, o Ministério Público do Trabalho atua contra a discriminação dos conforme determina a Constituição Federal. “No artigo 3 da principal legislação brasileira está escrito sobre a necessidade de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Já o artigo 7° trata da proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”, explica a advogada.
Fabiana Zani destaca algumas outras legislações que visam ajudar na inclusão, especialmente de pessoas trans. “O uso do nome social é um dos direitos que precisa ser respeitado. O decreto Decreto nº 8.727/2016 dispõe no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Contudo, essa é uma regra que deve valer para as empresas que desejam adotar políticas inclusivas e se tornarem parceiras de entidades de proteção dos direitos LGBTs. Esse é um primeiro passo importante. Assim como, a garantia do uso de banheiros, vestiários e demais espaços separados por gênero, quando houver”.
O advogado Rodrigo Salerno alerta ao fato de que o assédio moral e o preconceito estão entre as principais queixas das pessoas LGBTs. Informação que confere com a pesquisa da LGBT+ Inclusion @ Work: A Global Outlook e Deloitte. De acordo com o levantamento, quase metade dos entrevistados (42%) relataram ter sofrido preconceito no ambiente de trabalho.
“Situações entre empregados costumam ser resolvidas a partir do posicionamento da chefia, também por regras de conduta claras e políticas institucionais que promovam a diversidade e inclusão. Contudo, o assédio moral é definido como exposição de pessoas a situações humilhantes e constrangedoras no ambiente de trabalho, de forma repetitiva e prolongada e, via de regra, por alguém de cargo superior. Nesta situação, a vítima pode entrar com uma ação judicial de reparação de danos morais e tem a garantia de receber todos os seus direitos trabalhistas. Para que as empresas se previnam de acusações desse tipo, é importante canais de denúncia capazes de fazer a investigação, além de políticas internas que desestimulem e promovam punições para atitudes LGBTfóbicas”.
Crime – A legislação brasileira trata casos de assédio moral a partir do direito trabalhista e também civil. Atitudes preconceituosas e discriminatórias podem ser caracterizadas como crime. Desde 2019, de acordo com o STF (Superior Tribunal Federal), casos de homofobia e transfobia podem ser enquadrados na Lei do Racismo ( Lei nº 7.716/89), que considera o ato um crime inafiançável e imprescritível, com previsão de um a três anos de reclusão. Até mesmo em casos de ofensas, o artigo 140 do Código Penal determina punição para quem injuriar alguém, ofendendo a dignidade ou o decoro. A pena é detenção, de um a seis meses ou multa; no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
Diversidade dentro das empresas
A diversidade e a inclusão dentro das empresas são capazes de mudar a forma como as instituições percebem o mundo, desenvolvem seus produtos e atendem seus clientes. Isso ocorre porque amplia o número de olhares e perspectivas na busca de soluções e novos projetos.
Uma pesquisa divulgada pela revista Exame, feita pelo Instituto Identidades do Brasil (IDBR) evidenciou os impactos da diversidade no mercado de trabalho: a cada 10% de aumento na diversidade étnico-racial, acontece um salto de quase 4% na produtividade das empresas; e para cada 10% de elevação da diversidade de gênero, o acréscimo foi de aproximadamente 5%.
“Cada vez mais as empresas são cobradas em sua responsabilidade social, seja em âmbito jurídico ou público. Existem diversas organizações, grandes e pequenas, que ajudam a população a identificar quais delas são mais inclusivas, éticas e comprometidas com o desenvolvimento social e outras pautas importantes na contemporaneidade, como meio ambiente. A diversidade dentro das corporações, portanto, é uma perspectiva que deve ser considerada”, orienta Rodrigo Salerno.
Para o advogado, diversidade e inclusão correspondem a “incentivar a participação de todos os empregados na vida da empresa; criar um código de ética com informações sobre o que é o assédio moral; dar a oportunidade para que pessoas LGBTQIAP+ também tenham cargos de liderança; realização de atividades de capacitação; promoção de boas relações no ambiente de trabalho; evitar omissões em situações de preconceito e assédio moral; criar canais de denúncia e protocolos para que as vítimas se sintam seguras em reportar o que vivenciaram; e oferecer apoio psicológico aos colaboradores que passaram por essas situações”. Tudo isso passa também pelo exemplo de comportamento e conduta dos gerentes e gestores das empresas, que devem estar conscientes e preparados para essas mudanças.
Significado das siglas – A sigla LGBTQIAP+ tem como propósito a inclusão e a visibilidade das mais diversas identidades, expressão de gênero e orientação sexual. A nomenclatura representa: Lésbicas; Gays; Bissexuais; Transgêneros; Queer; Intersexuais; Assexuais; Pansexuais e outros grupos e variações de sexualidade e gênero. Outros termos que valem a pena entender sobre o assunto são: Identidade de gênero significa a percepção que a pessoa tem de si, a forma como se entende como um indivíduo social. Já a expressão de gênero é como essa pessoa se manifesta em público. Sexualidade está relacionada à genética binária em que a pessoa nasceu: masculino, feminino; e também intersexual. Por fim, a orientação sexual é a prática de se relacionar afetiva e/ou sexualmente com outros gêneros.
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