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Os pães que nos alimentam ou viciam – Por Alessandra Cerri

Dostoiévski em seu espetacular livro “Os irmãos Karamazov” (escrito no séc.XIX) faz profundas reflexões sobre a humanidade e o comportamento humano. Não por acaso foi considerado por Freud uma das maiores obras já escritas. Em uma dessas reflexões ele coloca que a maior inquietude da humanidade é saber a quem adorar: os pães celestes ou os pães terrestres. Mais ainda, segundo ele, nossa maior liberdade associada a nossa fragilidade e mediocridade é exatamente o que nos aprisiona e nos torna dependente dos pães que optamos por adorar.

Interessante observar que estamos vivenciando um aumento crescente e preocupante no números de pessoas sofrendo por ansiedade e depressão. Estamos percebendo um mundo estressado, com pessoas com baixo nível de tolerância, altamente nervosas e egocêntricas. “Coincidentemente” estamos vivendo uma época de consumo desenfreado, busca enlouquecida por procedimentos estéticos, uma necessidade gritante de exibição e pertencimento a redes sociais.

Yuval Harari, um brilhante escritor da atualidade, em uma de suas citações nos diz o seguinte: “O homo sapiens simplesmente não é programado para se satisfazer. A felicidade humana depende menos de condições objetivas e mais de nossas próprias expectativas daquilo que esperamos obter…”

Neste encontro de épocas por meio desses escritores podemos perceber que algumas coisas não mudaram muito, talvez até tenham piorado com o tempo. Os exuberantes avanços tecnológicos conseguidos com as revoluções científica e industrial podem ter perturbado consideravelmente nossa percepção das necessidades e nossas expectativas em relação a felicidade.

A revolução científica nos possibilitou evoluir muito, nos mostrou a necessidade de reconhecer nossa ignorância e a necessidade de buscarmos constantemente as verdades da vida. No entanto, ela nos tornou racionais demais, o que pode nos tornar céticos a ponto de não acreditar nos milagres da vida ou aceitar os mistérios do universo, o que por vezes pode nos afastar de nossa espiritualidade e aumentar nossa arrogância.

A revolução industrial, por sua vez, nos tornou obcecados por produzir e consumir, nos fez acreditar que devemos adorar os pães terrenos e nos fez buscar a felicidade em coisas materiais e superficiais. Assim, nos tornamos altamente produtivos, super antenados e em constante aperfeiçoamento profissional porém, possivelmente, distantes de nossa espiritualidade e de nós mesmos.

Enquanto homo sapiens, temos uma necessidade de vivermos em comunidade (isso está em nossa essência) e os dois autores, cada um na sua época, citam que essa característica faz com as nossas prioridades, ou a percepção delas, sejam influenciadas pela coletividade.

No entanto, num mundo onde o maior capital é a informação e no qual somos viciados em tecnologia, onde as mídias sociais exercem uma influência absurda em nossos desejos e comportamentos podemos perceber à nossa fragilidade frente a adoração aos pães terrestres e o esquecimento da nossa necessidade de pão celestial, o que nos torna muitas vezes medíocres.

Enquanto seres humanos, somos dotados de duas grandes habilidades: física e cognitiva. A física acabamos delegando às máquinas, que nos substituíram em inúmeras atividades. Importante não nos esquecermos de usar nossa maior riqueza, nossa cognição, para distinguirmos entre os pães que devem nos alimentar. Que nossa habilidade de raciocinar nos possibilite saber usufruir de nossas conquistas tecnológicas e inovações com discernimento e coragem para dizer não aos exageros, tendo humildade para reconhecer nossa limitação diante de um poder milagroso que nós jamais conseguiremos desvendar totalmente ou superar.

Finalizarei o texto de hoje com uma frase de Dostoiévski “…quanto ao mundo espiritual, que é a metade superior do ser humano, ele é rejeitado, banido com júbilo e até com ódio. O mundo proclamou a liberdade, principalmente nos últimos anos; mas o que representa essa liberdade?  Nada além de escravidão e suicídio…” . Namastê e até a próxima!!

* Alessandra Cerri é sócia-diretora do Centro de Longevidade e Atualização de Piracicaba (Clap); mestre em Educação Física, pós-graduada em Neurociência e pós-graduada em Psicossomática.


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